quarta-feira, 21 de agosto de 2013

     A Aprendizagem Segundo Freud


                                                                                                                Patrícia Valéria G. do Nascimento

 Ao invés de abordar, como foi feito até hoje, o desenvolvimento da criança em termos de fases psicossexuais, pode-se adotar um outro caminho. O que poderia ser, para Freud, o fenômeno da aprendizagem? Em outras palavras, o que, no entender de Freud, habilita uma criança para o mundo do conhecimento? E, finalmente, em que circunstâncias essa busca do conhecimento se torna possível?

No entanto, Freud, por sua própria posição frente ao conhecimento, gostava de pensar nos determinantes psíquicos que levam alguém a ser um “desejante de saber”. Nessa categoria incluem-se os cientistas, que devotam a vida à pergunta por quê, e as crianças, que, a partir de um determinado momento, bombardeiam os pais com por quês.

O que se busca quando se quer aprender algo? Só a partir dela pode-se refletir sobre o que é o processo de aprendizagem, pois o processo depende da razão que motiva a busca de conhecimento.

Por que a criança pergunta tanto?
A criança que pergunta por que chove, por que existem noite e dia, por que... e todo o resto, responde Freud, está na verdade interessada em dois porquês fundamentais: por que nascemos e por que morremos, ou, dito o modo clássico, de onde viemos e para onde vamos.

Há, para Freud, um momento decisivo na vida de todo ser humano: o momento da descoberta daquilo que ele chama de diferença sexual anatômica. Se, até então, os meninos e meninas acreditavam que todos os seres humanos eram ou deviam ser providos de pênis, a partir desse momento “descobrem” que o mundo se divide em homens e mulheres, em seres com pênis e seres sem pênis.

Sejamos mais precisos. Essa descoberta não é propriamente uma descoberta, já que meninos e meninas terão tido oportunidade, antes dela, de observar que são diferentes. A diferença está na interpretação dada a esse fato. Meninos poderiam pensar, por exemplo, que as meninas não são iguais a eles, podem vir a ser, quando crescerem. Mas a descoberta implica entender que, de fato, alguma coisa falta.

No entanto, o que angustia não é a constatação de que algo falta às mulheres, e pode vir a faltar aos homens. A angústia provém de uma nova compreensão de antigas perdas à luz desse novo sentimento de perda.

A essa angústia das perdas Freud chamou de angústia de castração.

Freud achava, de início, que a pergunta pelas origens era denotada depois que um irmão nascia, e isso quando a criança já tinha mais ou menos 2 anos (antes, tal conhecimento não tinha esse poder detonador).
É claro que as coisas não são mais assim tão simples; se assim fosse, os filhos únicos jamais atravessariam a angústia de castração. Freud mesmo, percebeu isso e buscou determinantes mais estruturais que, a princípio, ele apenas observou. Essa busca dos determinantes mais estruturais levou-o justamente a desenvolver melhor um dos aspectos mais importantes de sua teoria: o complexo de Édipo; e o Édipo é o processo através do qual uma menina se “define” como mulher e o menino como homem (ou vice-versa), depois de terem extraído das relações com pai e mãe as referências necessárias a essa definição.

A criança descobre diferenças que as angustiam. É essa angústia que a faz querer saber. Só que a abordagem direta é difícil, justamente por que envolve angústia. Os instrumentos de que a criança pode dispor são o que Freud chamou de “investigações sexuais infantis”.

Para Freud as primeiras investigações são sempre sexuais e não podem deixar de ser: o que está em jogo é a necessidade que tem a criança de definir, antes de mais nada, seu lugar no mundo. E esse lugar é, a princípio, um lugar sexual.

E a pergunta: de onde viemos e para onde vamos o que tem a ver com isso? Acontece que esse lugar sexual é situado, a princípio, em relação aos pais. Em relação ao desejo dos pais o “de onde viemos” equivale a “qual é minha origem em relação ao desejo de vocês? Por que me puseram no mundo, para atender a quais expectativas e esperando que eu me torne o que?”

Assim, as perguntas sobre a origem das coisas estariam na base das investigações sexuais infantis. As crianças vão à escola para aprender a ler e a escrever não parecem denunciar nenhuma dessas preocupações.

O que se espera é que, ao final da época do conflito edipiano, a investigação sexual caia sob o domínio da repressão. Parte delas sublimam-se em “pulsão de ver”. Sem cair em discussões acadêmicas a respeito da validade conceitual de termos como pulsão de domínio, por exemplo, pode-se, extrair o mais importante: o desejo de saber associa-se com o dominar, o ver e o sublimar.  Até aqui, pode-se perceber que a ênfase dada por Freud ao estudo da relação entre um professor e um aluno não estava no valor dos conteúdos cognitivos que transitam entre essas duas pessoas. Vale dizer, na informação que é transmitida de um para o outro. A ênfase freudiana está concentrada nas relações afetivas entre professores e alunos.


Que são transferências?

São reedições dos impulsos e fantasias despertadas e tornadas conscientes durante o desenvolvimento da análise em que trazem como singularidade característica a substituição de uma pessoa anterior pela pessoa do médico. Podemos dizer também que é uma série de acontecimentos psíquicos que ganham vida novamente, agora não mais como passado.

Assim, um professor pode tornar-se a figura a quem serão endereçados os interesse de seu aluno por que é objeto de uma transferência. Esta é a visão de Freud sobre a transferência na relação analítica e, por extensão, na relação pedagógica. Na verdade a ideia de que o aprendizado tem como fundamento a transferência, está cada mais presente entre os analistas engajados na formação psicanalítica. Podemos dizer que na relação professor – aluno, a transferência se produz quando o desejo de saber do aluno se aferra a um particular, que é a pessoa do professor.

A ideia de transferência mostra que aquele professor em especial foi “investido” pelo desejo do aluno. A desejo transfere sentido e poder à figura do professor, que funciona como um mero suporte esvaziado de seu sentido próprio enquanto pessoa. Mas, que sentido esse desejo transfere? Esse desejo e seu sentido singular escaparão sempre ao professor.

Cedendo a esta tentação, cessa o poder desejante do aluno. O professor entenderá sua tarefa como uma contribuição à formação de um ideal que tem uma função reguladora, normatizante, e fundará aí sua autoridade. Sua missão será submeter seu aluno a essa figura de mestre. Neste caso, a educação fica subordinada a imagem de um ideal estabelecido logo de início pelo pedagogo e que, simultaneamente, proíbe qualquer contestação desse ideal.



 

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